segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Foi você o erro mais bonito que eu cometi

Faz tempo que ando assim, suspenso. Faz tempo que me vejo bobo, indeciso e sem graça. A cabeceira da nossa cama continua no mesmo lugar e agora não existem mais motivos pra consertar ou trocar. Lembro que no início eu te prometi uma cama nova, uma big size king master dessas que te daria espaço, que me permitiria buscar a pipoca que apitou no microondas e te ver esparramada, dormindo no meio do filme quando eu voltasse. Como você conseguia estar frenética e faladora num instante e logo em seguida - e era só eu virar as costas- estar dormindo? Serena. Fingida. Calma? Plasma, pálida, pueril. Fazendo cena pra eu ver. Você: vedete do meu cinema. Eu: seu público fiel.
O meu erro foi não entender a sua identidade mutante, cambiante. Seu doce azedo imprevisível. O seu "não quero mais". Eu nunca soube o que esperar dos seus cabelos.
Lembro de me surpreender com seu conforto com a cama pequena. "Assim a gente fica mais juntinho", você dizia sem saber que eu morria de medo de te sufocar (na cama, no beijo, em tudo) e passava horas apertado contra a parede só pra te dar espaço, só pra admirar a mansidão do seu sono, único momento em que você era minha de verdade. Havia qualquer semelhança com o que é frágil, como a bailarina da caixa de música que você tanto odiava.
Mas hoje a gente sabe, moça, que quem quebrou foi a cama de solteiro que reflete direitinho o estado no qual eu fiquei quando deixei você ir embora.
A gente sabe que desde que te vi, de vestidinho preto e sapato esquisito cantarolando alguma coisa ininteligível, que as coisas estavam claras como nos filmes: aquele seu jeitinho de boneca malvada ainda ia ser a minha ruína. Você me ganhou quando perguntou sorrindo se o ônibus passava por ali. Eu, um estranho, e você sorriu pra mim. Eu te escolhi ali naquela parada de ônibus e nunca soube entender direito como você me escolheu de volta.
Um dia eu esqueci o nome de tudo o que me cercava, tentei lembrar os nomes que te dei, mas havia esquecido todos eles. Fiquei vaidoso em não te querer mais, mesmo sabendo que te queria mais que aquela coletânea dos Beatles.
Me senti grande e forte em te fazer chorar.
Mas existem as músicas e os bilhetes do metrô. E eles me lembram que você foi o erro mais bonito que eu cometi. Tem sua escova de dentes na pia, do lado da sua coleção de esmaltes -todos verdes, "não sei porque você tem tantos esmaltes iguais" ... " não são iguais, amor, é verde mar, verde militar, verde selva, verde malte"
E agora que tudo acabou, agora que minhas mãos estão suspensas, imóveis, agora que me assumo sujo e feio, entendo a lógica cruel desse jogo. Eu que tinha tanto medo de te chamar de amor, um dia desses gastei uma caneta bic inteirinha escrevendo essa palavra de quatro letras no meu corpo como quem marca o gado a ferro.
Aí eu escolho um desses festivais que você sempre vai -péssima escolha- e tento falar com você, que só me olha com aquela cara de "estou feliz com meus novos melhores amigos temporários" que só você tem. Maldita.
Faz assim: não me olha. Faz melhor: só me olha. Me olha com essa sua cara de tanto faz pra que eu tenha certeza de que a gente nunca aconteceu. Você não sabe, mas eu andei te olhando de longe e você estava com essa mesma cara de "sou doidinha, está tudo bem" enquanto desmoronava por dentro, que eu sei.
Eu olho você e tento ver mais uma vez v essa sua armadura estúpida de garota bem resolvida com a qual a gente só tem uma chance. Pra minha surpresa, te vejo deslizar tão tranquilamente pelos lugares, pelos grupo de amigos dos amigos, que tenho medo.
Isso te coloca tão distante de qualquer ser de all star e barba por fazer, que mesmo que você sorrisse gentil e maliciosa, haveria alguma coisa a temer. Seus cabelos talvez. Havia alguma coisa naquele seus cabelos que me intimidava. Havia alguma coisa na vermelhidão esvoaçante dos seus cabelos que me dizia- e dizia a todos: não erre, você só tem uma chance.
Você é estranha. Seus quadris falam quando você anda e isso me dá medo, garota.
A máquina do tempo do filme da Sessão da Tarde talvez fosse útil pra voltar agora àquele momento em que eu te quis na minha mão só pra te quebrar, porque a bailarina da caixinha de música era você.

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