Esse é um blog destinado ao relato de um processo criativo para a montagem de uma perfomance inspirada no texto O Banquete de Platão. As provocações são feitas por mim, Leandro Menezes, aos performer´s participantes e contribuintes do trabalho.
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
Reflexão de um processo.
O resultado.
Esperei alguns dias para conseguir escrever sobre o processo. Precisei refletir, repensar, e analisar esse estágio da criação da performance Sabor – Primeiro recheio. No início do trabalho minha proposta era traçar uma relação etimológica da palavra Saber com Sabor. Ao ler o texto do Banquete, Platão me sugeriu uma forte ligação da disputa do conhecimento com os autores do texto. Todos falavam, competiam, triunfavam numa tentativa de ter o maior conhecimento ou saber sobre o Amor. Minha primeira relação com o texto foi de impaciência com essa prepotência de tornar algo tão abstrato em palavras e definições. Meu caminho foi traçado por uma serendiptidade do processo. Ao passar dos ensaios ainda sem conseguir entender o que buscava com esse conceito, fui lançando provocações aos participantes: Qual seu limite enquanto artista? O que representa o Amor pra você? Você já amou? Uma loucura por amor? Frases ainda sem um contexto com o trabalho. Chegou determinado momento que precisava vê-los criar sozinhos, eles mostrarem as referências artísticas próprias. Comecei a passar tarefas a serem realizadas por eles como dever de casa, pequenas performances, cenas, estímulos, filmes, tudo aquilo que enriquecesse o universo deles. O material começou a se tornar mais íntimo e agressivo, onde a cada momento um grau de exposição, intimidade e confiança foi surgindo. Em determinado momento me vi sem rumo, sem destino com tudo aquilo de material que eles traziam. Começamos a traçar uma dramaturgia a partir de palavras, de estados, de sentimentos e a tentar estabelecer relações entre eles. Comecei a me afastar da proposta inicial de tentar abordar a relação corpo/comida/sabor/saber e a partir para o prazer, o sabor da dor, o amor proibido, o amor sujo de comida que se torna sujo de valores, a entrar na zona do escatológico, o devorar-se, devorar o outro, oferecer –se. O grau de intimidade e entrega dos performers foi fundamental nessa etapa do trabalho, ao mesmo tempo que eles apresentavam dúvidas sobre o que ocorria em cena em relação a atuação. Assumir a performance enquanto obra, aceitar o corpo enquanto material e mídia daquilo que estava sendo construído. A nudez surgiu como peça fundamental e necessária para o trabalho. Sempre condenei qualquer tipo de auxílio antes de entrar em cena, para esse trabalho era exigido que cada intérprete bebesse uma garrafa de vinho para que todo o vinho do banquete fosse surgindo de dentro dos intérpretes. Se Platão apresenta um discurso verborrágico, vomitado sobre o amor, eu em minha prepotência de criador, devolvo e brindo a morte de Platão com o vômito dos performers e vinho fermentado de seus corpos. Eu devolvo a Platão o recheio de que somos feitos, vômitos, prazer, urinas, salivas e desejos. O Sabor – Primeiro Recheio tornou-se um trabalho indo contra a Platão, propondo apresentar aquilo que nos recheia e nos torna desejo, carne e censura. Apesar de todo o percurso de crises, serendipidades, esse trabalho me marca na possibilidade de fazer algo que eu acho feio, sujo, nojento, mas que nele ainda exista uma poesia e uma reflexão, e a possibilidade da aceitação de tornar arte aquilo que eu não abordaria ou teria curiosidade.